A descoberta inicial foi em 1975, mas a polêmica esperou quase quatro décadas para estourar.
Uma chocada Irlanda viu-se envolvida nos últimos dias no mais novo escândalo do tratamento indigno que jovens mulheres consideradas desviantes pela sociedade receberam no país católico conservador durante boa parte do século XX: uma historiadora descobriu agora que quase 800 esqueletos de crianças encontrados há 39 anos numa fossa séptica ao lado de um antigo convento da cidade de Tuam.
O convento Santa Maria, administrado por freiras do Bom Socorro, abrigou jovens mães solteiras — a maioria internada à força pelas famílias — entre 1925 e 1961. Anteriormente pensava-se que os restos mortais eram de vítimas da fome que assolou o país em meados do século XIX e que matou centenas de milhares de pessoas.
Catherine Corless |
— Alguém havia mencionado a existência de um cemitério para recém-nascidos, mas o que encontrei é muito mais que isso — declarou a historiadora Catherine Corless.
A reação da sociedade foi imediata. O parente de uma criança que nasceu na instituição entrou na Justiça para saber o que aconteceu lá. Segundo os registros do convento — que foi demolido para dar lugar a um conjunto habitacional, mas teve o local dos esqueletos preservado — as crianças morreram de desnutrição, doenças e maus-tratos. A mais velha tinha 9 anos, e o menor, dois dias.
O testemunho de uma mulher de 85 anos (identificada somente por seu nome de batismo: Mary) que em sua juventude passou quatro anos na instituição, confirmou as condições de vida miseráveis das mulheres internadas e de seus filhos, a alimentação insuficiente, a falta de higiene e os maus-tratos.
O secretário de Estado de Educação, Ciaran Cannon, pediu que se abra uma investigação, e o Gabinete vai abordar o tema. “Muitas das revelações são profundamente perturbadoras e uma lembrança impactante de um passado obscuro na Irlanda em que nossos filhos não eram amados como deveriam”, complementou Charlie Flanagan, ministro da Infância e Juventude.
Diarmuid Martin |
O arcebispo de Dublin, Diarmuid Martin, também se juntou ao coro dos que pedem uma investigação, deixando, no entanto, a porta aberta a outras soluções.
— Se um inquérito público não for feito sobre os temas importantes pertinentes às casas para mães e filhos, então é importante que um projeto de História Social seja realizado para termos um quadro acurado desses estabelecimentos na História de nosso país — disse ele.
Ao investigar os arquivos do convento, no Oeste da Irlanda, a historiadora descobriu que 796 bebês foram enterrados sem caixão ou lápide. Ela descobriu a extensão da vala comum quando pediu os registros de mortes de crianças. Os recém-nascidos teriam sido enterrados de maneira secreta pelas freiras. De acordo com Catherine Corless, a taxa de mortalidade para crianças no convento era quatro a cinco vezes maior que o da população em geral.
A descoberta recorda outro escândalo que também envolveu mães solteiras. Entre 1922 e 1996, mais de dez mil jovens trabalharam de maneira gratuita em lavanderias exploradas comercialmente por religiosas católicas na Irlanda. As internas conhecidas como as “Irmãs Madalena”, eram jovens solteiras grávidas ou que haviam demonstrado um comportamento considerado imoral no país fortemente católico.
Fontes: O Globo e El País
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